LIVRO DO MÊS - Correr com Rinocerontes

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Correr com Rinocerontes, de Cristiano Baldi, possui uma mensagem muito clara: é da natureza humana encontrar maneiras de fugir da realidade. Podemos constatar isso em cada página do primeiro romance do escritor gaúcho, fruto do trabalho de conclusão do curso de Mestrado em Escrita Criativa da PUCRS.

O livro traz as reflexões de um narrador anônimo, que é obrigado a abandonar mestrado e namorada em São Paulo para voltar para casa, em Porto Alegre por conta de uma tragédia envolvendo sua família, formada por acadêmicos da elite intelectual do Rio Grande do Sul.

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Sem seguir uma narrativa linear, o texto flui conforme a linha de raciocínio do narrador. Algo semelhante à escrita de Clarice Lispector, embora Baldi seja menos espontâneo, trabalhando mais o texto, o tornando mais coeso e melhor estruturado. O narrador emenda uma história na outra, transitando entre o passado e o presente, aparentemente de forma desorganizada. Somente na metade do livro é que iremos descobrir o que o obrigou a voltar para Porto Alegre. É a partir daí que o narrador começa a fechar as pontas soltas, mostrando que ele sempre soube onde queria chegar.

A atmosfera é perturbadora, suja e entrecortadas pelo sarcasmo constante do narrador que, ainda que inconscientemente, deixa claro seu desgaste psicológico por tudo que aconteceu com sua família ao falar, por exemplo, de seu desejo de "meter uma banana de dinamite no cu do mundo e explodir tudo".

Porém, como ele mesmo afirma: a vida nos transforma em "máquinas de aceitação", onde sempre encontraremos maneiras de seguir adiante, seja se tornando uma carola como sua avó, seja fingindo que está tudo bem como seu avô, seja indo fazer mestrado em São Paulo apenas apara fugir da família como o narrador.

No entanto, até o final do livro, ele não percebe que também foge a realidade e acredita que está isento de suas críticas, ao falar sem pudores sobre seu "pauzão de judeu" ou quando deprecia tudo o que cerca Porto Alegre, como o friozinho que "mata quase uma dezena de indigentes".

A grande ironia é que quando finalmente ele se dá conta que também vive em negação, ele se conforma com isso e segue em frente aceitando que o que aconteceu foi "algo trivial como sempre é". Não há sequer um arco para o personagem. Por mais que todos os infortúnios que o destino lhe impõe o levem a refletir sobre sua vida percebendo seus próprios erros, ainda assim ele os aceita cinicamente e segue a vida. Trivialmente.

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